domingo, 12 de maio de 2013

Morte e Vida Severina - Parte III



ANÁLISE DO POEMA MORTE E VIDA SEVERINA
Vinicius Monteiro
"Morte e vida Severina" foi escrita em 1956, por João Cabral de Melo Neto, obra que trata da história de Severino retirante de 20 anos, que vai da Serra da Costela, limites da Paraíba, seguindo o curso do rio Capibaribe com o objetivo de chegar em Recife.

Na primeira cena, podemos observar a dificuldade da apresentação de Severino, que tenta individualizar-se, mas não consegue fazer essa particularização por existir tantos Severinos iguais a ele. Vejamos os fragmentos da obra: Meu nome é Severino, [...] Severino de Maria; [...] fiquei sendo o da Maria do finado Zacarias. [...] Como então dizer quem fala ora a Vossas Senhorias?

Com essas palavras podemos observar a grande dificuldade de Severino na tentativa de tornar-se um ser único, distinguir-se dos demais. E devido a esse impedimento o nome próprio, particular Severino, acaba por tornar-se geral, coletivo, pois existem inúmeros Severinos iguais ao Severino. Somos muitos Severinos iguais em tudo na vida: na mesma cabeça grande que a custo é que se equilibra, no mesmo ventre crescido sobre as mesmas pernas finas.
Nessa citação observamos o fracasso de tentar-se individualizar, por mais que ele tente ser único, percebe que é igual a todos os Severinos.
E no final da primeira cena, Severino diz que, [...] passo a ser o Severino que em vossa presença emigra. Mas, assim mesmo, ele é igual aos outros. Quantos Severinos não emigram?
Dessa forma, o Severino nome próprio acaba-se como um adjetivo generalizando Severino, torna-se coletivo, geral, sinônimo de pobreza, fome, doença, morte, dificuldade de sobrevivência, etc. Seja pela vida repleta de impedimentos, seja pela morte Severina. [...] mesma morte Severina: que é a morte de que se morre de velhice antes dos trinta, de emboscada antes dos vinte, de fome um pouco por dia (de fraqueza e de doença é que a morte Severina ataca em qualquer idade, e até gente não nascida).
Como colocamos no início deste texto, Severino sai da Serra da Costela, em busca de vida, melhores condições de sobrevivência, entretanto, o que vê nessa peregrinação é apenas morte, a única vida é o rio Capibaribe que ele segue, porém, às vezes, esse rio torna-se estreito, e o protagonista fica com medo de perder seu único fio de vida.
Já foi mencionado que Severino encontra apenas dificuldades, morte em sua peregrinação, vale dizer que a única pessoa que está em melhor situação é uma mulher que trabalha com a morte, vive da morte.
[...] ali, que se não rica, parece remediada ou dona de sua vida: vou saber se de trabalho poderá me dar notícia. [...] Sabe cantar excelências, defuntos encomendar? [...] trabalhávamos a meias, que a freguesia bem dá. [...] como aqui a morte é tanta, vivo de a morte ajudar. [...] uma profissão, e a melhor de quantas há: [...] Só os roçados da morte compensam aqui cultivar [...].
Após a peregrinação Severino chega em Recife, o retirante senta-se para descansar ao pé de um muro alto e ouve, sem ser notado, a conversa de dois coveiros e esse diálogo o afeta muito.
[...] __ Esse povo lá de riba de Pernambuco, da Paraíba, que vem buscar no Recife poder morrer de velhice, encontra só, aqui chegando cemitérios esperando. __ Não é viagem o que fazem, vindo por essas caatingas, vargens; aí está o seu erro: vêm é seguindo seu próprio enterro.
Severino estava ciente de que muita coisa não iria encontrar, pois o que o fez retirar não foi a cobiça, mas sim, defender sua vida da velhice que chega antes dos trinta, ou seja, condições melhores para sobreviver, entretanto, ouve essas palavras, a voz da consciência, e isso o deixa atônito, veio seguindo sua própria morte. Ele que veio seguindo a vida (rio) e esperava encontrar vida.
Nessa situação, Severino decide morrer “a de saltar, numa noite, fora da ponte da vida?”, pular da ponte do rio, a única vida que ele encontrou ao longo desse caminho percorrido até Recife. Mas, nesse momento, nasce um bebê: “saltou para dentro da vida? / Saltou para dentro da vida [...].
A personagem que havia feito uma pergunta a respeito do seu provável suicídio ao seu José, mestre Carpina tem a resposta com o nascimento do bebê, vida: [...] ela, a vida, a respondeu com sua presença viva [...] E não há melhor resposta que o espetáculo da vida: vela desfiar seu fio [...] mesmo quando é a explosão de uma vida Severina.
Observamos, nesses fragmentos, além da resposta de Severino entre saltar ou não saltar da ponte da vida, a questão do próprio título da obra. Por que Morte e Vida Severina?
Sabemos que tudo que é vivo inicia com a vida, contudo, João Cabral começa uma obra com a morte, já que a personagem ao longo de sua jornada encontra apenas a morte, decide morrer, mas no final de sua peregrinação aparece a vida, aquela criança que nasce, nem que seja para ter um destino Severino, apesar da pobreza, nasce uma vida e todos ficam felizes e esse acontecimento gera esperança a nosso Severino, a esperança vem da própria vida. Esse nascimento muda a vida do herói, pois dá sentido a sua própria vida, vê que a vida ainda tem sentido.
A história de Severino é a mesma de outros tantos, história de sofrimento, contada pelo escritor com sensibilidade e crítica social. É muito interessante o modo como o autor constrói sua poesia, pois converte a miséria, indigência, fome, secura da paisagem num elemento poético de tal plasticidade, de tal essência que tudo torna-se de uma beleza inigualável.
E, acima de tudo, a história de Severino de João Cabral termina, porém a dos demais Severinos continua, porque ainda hoje os retirantes continuam a fugir da seca do sertão Nordestino.

Fonte: aqui.
 
#Mesmo anos passados do meu primeiro encontro com a obra, ainda fico extasiada com a beleza da sua escrita. Os problemas do Nordeste do Brasil ainda continuam tão ou mais severos desde quando a criação da obra...
 
#Espero que tenham gostado!
 
:]
 

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